domingo, 26 de julho de 2009

Complementando -- Parte I

Olá a todos. Esta é a primeira parte de um artigo que visa complementar, em termos de histórico e ambientação, o Kit Maestro da Realidade apresentado no primeiro artigo da Iniciativa 3D&T Alpha. Aqui eu apresentarei um histórico e as fichas (para 3D&T) dos dois personagens que apareceram no artigo. Pois bem, vamos a eles!

Histórico

Alguém aí lembra da frase de citação no início do artigo?

"Nunca, jamais, mencione a ele a Execução de Thazarov, ou você vai morrer como aconteceu comigo."
-- fantasma de Belothus Gnezovsi, ex-maestro da Real Orquestra, sobre Kratekov Satkevenski, maestro da realidade.

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Ele estava orgulhoso, como poucos. Que mestre não sentiria um pingo de orgulho, em ver seu aprendiz finalmente superá-lo? Claro, muitos sentem inveja em serem passados para trás, temendo serem esquecidos em detrimento de seus alunos. Mas não Belothus; ele estava genuinamente orgulhoso. Cumprira seu papel.

Seria o primeiro grande concerto de Kratekov Satkevenski, o talentoso pupilo do Primeiro Maestro Belothus Gnezovski. O Theatro Imperial estava lotado aquela noite de início de primavera, quente mas com ventos refrescantes. Membros da Corte e do Parlamento, grandes banqueiros e industriais, intelectuais e acadêmicos, altos magos, e demais convidados ilustres -- toda a nata da sociedade da grande capital do Reino e do Império comparecera para prestigiar o espetáculo. Conta-se, inclusive, que a belíssima Condessa de Vickeyret, grande apreciadora de música erudita e a solteira mais cobiçada da estação, estaria no Theatro para acompanhar o concerto -- e as afiadas línguas das invejosas cortesãs diziam que ela mantinha um caso "aparentemente secreto" com algum membro da Real Orquestra. De qualquer forma, seria uma grande noite.

O burburinho tomava conta da platéia, enquanto aguardava o início do espetáculo. Um a um, os membros da Orquestra apareceram no palco, sentando-se em seus lugares, tomando seus instrumentos, testando-os e afinando-os. O arcano recém-contratado pelo Theatro incumbira dos detalhes: belas e finas jóias, incrustadas no arco superior do palco, brilhavam de forma mágica, enquanto nas paredes diversos pinos metálicos, pregados e encantados, cuidariam para tornar perfeita a acústica do salão; um servo invisível, instruído pelo profissional, cuidaria do jogo de iluminação e espelhos. Finalmente, surge um senhor ao palco, vestido como os outros músicos, mas com finos detalhes prateados em seus trajes -- era Belothus Gnezovski. O Primeiro Maestro curvou-se para a platéia, agradecendo sua ilustre presença.

"Senhoras, senhores, senhoritas e damas, meus queridos convidados." Sua forte voz, potencializada com um artefato mágico de amplificação de voz, gentilmente convidou as conversas do salão a morrer, o que imediatamente aconteceu. "Agradeço imensamente a presença nesta noite especial para mim. Irei apresentar a vocês aquele que, de fato e de direito, merece tomar meu lugar como Primeiro Maestro da Real Orquestra -- o que somente não ocorrerá porque ele possui outros grandes planos para aquela que, creio, será a carreira mais bem-sucedida de todos os maestros!" Afastando-se lentamente para a esquerda, virou-se para as cortinas ao fundo. "Com vocês... Kratekov Satkevenski!"

As cortinas se mexeram. Detrás delas, surgiu um homem que, a primeiríssima vista, poderia ser confundido com um músico realmente atrasado. Mas, perceberam que seus trajes eram quase idênticos aos de Belothus -- exceto os detalhes, que eram dourados e não prateados. Todos aplaudiram o jovem maestro, cobrindo eficientemente um novo burburinho, que corria sutil entre os espectadores.

E não era para menos. Enquanto Belothus possuía uma aparência bem cuidada, com um elegante conjunto de cavanhaque e costeletas a emoldurar a face, a despeito dos fios grisalhos, da calvície e das muitas rugas, e mantinha suas roupas impecavelmente bem-passadas, quase sem amarrotar, o mesmo não poderia ser dito do jovem Kratekov. Cabelos negros, grandes e rebeldes, rosto sem barba ou bigodes, trajes amassados com se tivesse levado um tombo a caminho do palco; o nariz adunco e o olhar maníaco completavam a aterradora visão do jovem -- ele era uma antítese quase perfeita de seu mestre.

"Ele está nervoso, o que é natural em suas circustâncias", pensou Belothus, ao ver seu pupilo. "Porém, ele se sairá bem." O Primeiro Mastro retirou-se para seu lugar na primeira fila, sentando-se ao lado de uma gentil senhora, sua esposa. Kratekov seguiu para a sua bancada, sacando a batuta do bolso do paletó. Os músicos, prontos, aguardavam o sinal, que não tardou a vir: três leves batidas no apoio da partitura, e o braço se ergueu para os céus.

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Kratekov Satkevenski nasceu e cresceu numa pequena vila, próxima da fronteira noroeste do Real Império, uma área abandonada pelas riquezas das grandes cidades e suas vizinhanças, onde apenas pequenos agricultores e criadores de animais viviam; somente uma pequena vila centralizava as atividades dos moradores locais, contando com um pequeno quartel e uma igreja. Justamente lá, quando o jovem maestro mal completara dez invernos, estava Belothus Gnezovski, na época aluno do Conservatório Imperial, com um grupo de amigos e amigas, em um fabuloso projeto de valorização da cultura para as comunidades carentes -- na verdade apenas uma desculpa desse grupo de alunos para viajar e aproveitar a vida, exceto pelo nosso amigo que, como coordenador, estava realmente entusiasmado pelo trabalho; mas não era enfadonho, concordava que uma mudança de ares faria bem à criatividade de qualquer músico, assim como um bom descanso das rotinas da grande capital. O grupo executou um pequeno concerto nessa vila, um espetáculo modesto mas muito bem recebido pelos seus moradores, que comparecerem em peso à praça central.

Foi então que Kratekov se destacou; o garoto curioso que quis ajudar os músicos durante sua passagem pela vila, aprendeu em poucos dias os rudimentos de diversos instrumentos que ele nunca vira, e que o grupo trazia consigo; dominava o violino tão bem que emocionou até o próprio violinista. Mas a verdadeira paixão do garoto foi a regência; quando viu Belothus coordenando a pequena orquestra de amigos, na praça da vila, ele ficou tão entusiasmado em aprender a arte que convenceu os pais a deixarem-no ir com os músicos, quando estes apareceram dispostos a levar o garoto ao Conservatório. "Um talento como o dele não pode ser desperdiçado, minha senhora!" Na manhã seguinte, o garoto foi embora da vila para nunca mais voltar. Estudaria na capital, até se tornar o prodigioso Kratekov Satkevenski.

O retorno dos músicos coincidiu com a formatura de Belothus Gnezovski e sua inclusão no corpo docente do Conservatório Imperial. Ele se tornou mentor pessoal de Kratekov, ensinando-o tudo o que sabia. E Belothus viu seu trabalho recompensado: o jovem era um verdadeiro virtuose da regência, não apenas coordenando, mas inspirando os músicos a oferecerem o seu melhor nas execuções. Contudo, o professor notara algumas peculiaridades intrigantes em seu aluno. Muitas vezes, ele se trancava em sua sala, buscando compor o que ele chamava de "execução perfeita", passando dias sem comer ou dormir. Poderia ser chamado de rabugento, uma vez que era pouco dado a amizades com os outros alunos -- embora tratasse Belothus com o respeito que se tem a um pai. Era sempre discreto quando ia a algum baile ou evento, como convidado do professor. "Muito embora, recentemente, ele esteja melhorando seu comportamento social", pensava o mestre.

Quando Belothus fora nomeado Primeiro Maestro, Kratekov decidiu anunciar-lhe seus planos: não iria sucedê-lo no Conservatório. O professor ficou desapontado, mas já imaginava por uma atitude assim -- o jovem era bastante irascível, ainda mais quando estava trancado em seu estúdio; certamente não teria a devida paciência para lecionar. Entretanto, foi o que Kratekov disse a seguir que realmente espantou seu mestre. "Pretendo partir em busca da execução perfeita." O jovem contou seus sonhos, envolvendo as lendárias composições perdidas do passado, e viajaria para outras terras, para encontrá-las. "Mas você ainda insiste nessa tolice, meu caro?" Foi a reação natural do velho mestre.

Um trovão soou lá fora. Foi a reação natural do jovem pupilo -- ao mover a batuta escondido, no bolso do paletó. Foi encarado como uma coincidência, obviamente -- mas Belothus não pôde deixar de intrigar-se por um instante, ao ver a expressão maníaca esboçada por Kratekov no momento; a mesma expressão com a qual ele entrou no Theatro, no dia de seu grande espetáculo.

Belothus não sabia, mas Kratekov já estava louco. Uma vida completamente preenchida pelas obsessões desenvolvidas pelo aprendiz terminou levando-o à insanidade. Em seu estúdio, sem que ninguém o visse, costumava reger para ninguém, como se uma orquestra invisível ali estivesse. No início, realmente não havia tal orquestra; um dia, contudo, após horas escrevendo partituras sem encontrar a peça que tanto desejava, ele se levantou de um rompante, colocou uma nova melodia codificada no apoio e pegou sua batuta. No momento crítico, um raio atingiu o estúdio, principiando um incêndio, que prontamente fora apagado quando movimentos suaves de sua mão trouxeram chuva. Kratekov Satkevenski era um Maestro da Realidade. E sua obsessão pela composição perfeita transformou-se numa loucura total.

Naquele mesmo dia, mais tarde, Belothus ensinou a Kratekov sua última criação, a Execução de Thazarov, um movimento extremamente rápido e difícil, que o jovem logo se pôs a treinar, sem sucesso. Foi então que Belothus disse: "Sabe, meu jovem, gostaria que você a apresentasse no próximo grande concerto da Real Orquestra. Ao menos uma apresentação final, antes de você partir. Aceita?" Ele aceitou, e prometeu dominar o movimento, o que desafortunadamente não aconteceu à época; ele havia quase dominado, e deixara uma mínima parte para a apresentação, onde mostraria a todos o seu grande talento. Espantado pela rapidez com que o pupilo havia dominado sua criação, as desconfianças de Belothus logo se tornaram certezas: o aprendiz superou o mestre.

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A apresentação foi um completo desastre -- e não somente porque o único movimento, executado perfeitamente, fora a Execução de Thazarov. Em um surto de insanidade, Kratekov fez do movimento a ruína de todos que estavam ali. Ao final da Execução, uma grande tempestade de raios irrompeu do exato centro do salão, matando muitos por eletrocussão. Um enorme tremor de terra o sucedeu, fazendo o teto do Theatro desabar. Foi uma verdadeira tragédia; exceto o jovem maestro, que havia fugido rapidamente ao perceber o que estava acontecendo, todos os presentes, dos músicos aos espectadores, morreram. Apenas o Imperador-Rei, o Primeiro-Ministro do Parlamento e suas famílias, além do Arcebispo da capital, escaparam, uma vez que não foram ao evento, por pura sorte.

No entanto, durante a tentativa de remoção dos escombros, o fantasma de Belothus Satkevenski fora encontrado. Cheio de remorso e culpa, ele não pôde completar a travessia que as almas dos mortos costumam fazer, mesmo com a intervenção do Arcebispo. Seu único objetivo é deter seu ex-pupilo, impedir que ele cause mais morte e destruição -- pois apenas depois da morte, Belothus compreendeu o que havia ocorrido com Kratekov: ele se tornara um Maestro da Realidade, um louco que poderia comandar a existência como se regesse uma orquestra. "Notas obscuras em antigos livros de músicos e compositores famosos revelam algumas poucas informações sobre eles", é uma das poucas frases que o triste fantasma repete para si mesmo, e para aqueles que conseguirem escutá-lo.

Os escombros foram retirados, e um memorial às vítimas fora construído. Um novo Theatro também fora construído. Além do Conservatório, estes são os lugares que costumam ser frequentados pelo fantasma do antigo maestro. Qualquer um que visite a capital ouvirá, de qualquer menestrel de taverna, bar ou pub, a triste história da tragédia do antigo Theatro, se assim quiser -- nem se passaram tantos anos desde então, e ela se tornara uma lenda viva da capital. Ultimamente, o fantasma do velho Belothus está inquieto; ao que parece, ele está buscando recrutar aventureiros para deter o Maestro da Realidade.

Fichas

Belothus Gnezovski: F0, H1, R0, A0, PdF0, 1 PV, 1 PM; Vantagem Única Fantasma (Incorpóreo; Imortal; pode conjurar Pânico sem nenhuma Vantagem Mágica, mas não tem PMs suficientes para fazê-lo; sem Invisibilidade; sem Possessão; Devoção: deter Kratekov); Especializações: todas de Artes que sejam relacionadas a Música; Especial: o fantasma de Belothus somente pode ser encontrado em três lugares: no Memorial do velho Theatro, no Novo Theatro, e no Conservatório.

Kratekov Satkevenski: F0, H3, R2, A1, PdF3, 10 PVs, 20 PMs; Especializações: todas de Artes que sejam relacionadas a Música; Genialidade; PMs Extras x1; Magia Elemental; Magia Negra; Insano: Obsessivo e Compulsivo (encontrar a composição perfeita, seja escrevendo por conta própria -- Compulsivo --, seja procurando as lendárias composições perdidas -- Obsessivo); Fetiche: batuta; Kit Maestro da Realidade (Magia Orquestrada e Bem Acabada; Regência dos Elementos da Natureza; A Realidade é apenas mais uma Orquestra).

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Só um comentário: além das influências já citadas no artigo, pude perceber outra, para o Maestro da Realidade, enquanto escrevia o conto acima: Castelo Falkenstein, e os grandes eventos da alta sociedade de Nova Europa, incluindo espetáculos artísticos como a apresentação de uma orquestra.

Na segunda parte, eu trarei uma aventura e um mini-cenário, concluindo a ambientação onde se encontram inseridos estes dois personagens. Até lá!

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